Bom
dia queridos amigos. Passadas mais algumas semanas sem tempo ou tampouco
inspiração para escrever, diante de tudo que se tem visto de tão ruim nas
mídias, de tantos ataques que sofremos diariamente, resolvi quebrar o silêncio
e, com ele, uma promessa que eu havia feito a mim mesmo: eu jurei que não ia
escrever nada sobre o caso “do momento”, relacionado àquela agente de trânsito
do Rio de Janeiro. Simplesmente porque acho tudo isso uma grande idiotice e que
ela e sua “causa” não merecem a minha atenção, nem a de ninguém.
Mas
como já tem gente demais usando
aquele caso pra tacar pedras em todo
o Judiciário, e – surpresa! – sem nenhum conhecimento sobre o que
realmente aconteceu, infelizmente vejo-me obrigado a falar um pouco
sobre o assunto. Até porque, como verão ao final, esse texto será uma crítica
aos Juízes do Brasil. Mais que isso: uma crítica dirigida a mim mesmo. Aposto
que por essa ninguém esperava ;)
Então,
vamos começar falando sobre a questão em si. O Juiz carioca estava voltando de
um plantão com um carro sem placas e estava sem seus documentos. Foi parado
numa blitz da “lei seca” no Rio de Janeiro. Se estivesse de jaleco branco e
dissesse que acabara de salvar a vida de um paciente que levou um tiro, com certeza seria simplesmente contemplado
por um sorriso e liberado. Mas se estivesse de terno e dissesse que estava
voltando do fórum, onde decretou a prisão de um assaltante que atirou em uma
pessoa, que foi hospitalizada, esse merece pedras, claro!
Nossas
Corregedorias nos orientam a nos identificarmos ao sermos abordados por algum
agente policial, a fim de que eles estejam, desde logo, cientes de nossas
prerrogativas funcionais (não ser preso senão por ordem escrita do Presidente
do Tribunal de Justiça, dentre outras). Isso não é dar “carteirada”. A meu ver, “dar carteirada” significa valer-se de
alguma condição especial para se furtar ao cumprimento de alguma obrigação. E
nada isso aconteceu.
A
Sra. Luciana, constatando as irregularidades administrativas, deveria ter feito
o que? Simples. Dito a ele que seria multado por estar dirigindo sem os
documentos de porte obrigatório, e que o veículo ficaria retido até que alguém
com habilitação viesse busca-lo, ou seria removido ao pátio do Detran.
De
acordo com a PROVA PRODUZIDA NO
PROCESSO (autos nº 176073-33.2011.8.19.0001) o Juiz em momento algum
faltou com respeito à Sra. Luciana. Isto está COMPROVADO.
A
Sra. Luciana, no entanto, por razões que cabe à psicologia tentar explicar,
passou a debochar do Juiz e ridicularizá-lo, perante todos os presentes, pelo
simples fato de ser Juiz. E ainda veio com essa frase profundamente infeliz:
“Juiz não é Deus”.
E ele
disse que era Deus, por acaso? Soltou um clássico “você sabe com quem está
falando”? Foi grosso, arrogante? Não, senhores. Nada disso. HÁ PROVAS de que não! O resto é
achismo, preconceito, inveja e dor de cotovelo.
“Ora, mesmo que
desnecessária a presença de um Delegado de Polícia para que o veículo fosse
apreendido, não se olvide que apregoar
que o réu era “juiz, mas não Deus”, a agente de trânsito zombou do cargo por
ele ocupado, bem como do que a função representa na sociedade.
In casu, mesmo que o réu
(reconvinte) estivesse descontente com a apreensão do veículo, o que é natural,
frise-se, inexiste nos autos qualquer
notícia de ofensa ou desrespeito por ele perpetrado em face da autora.
Além disso, o fato de
recorrido se identificar como Juiz de Direito, não caracteriza a chamada
“carteirada”, conforme alega a apelante.”
Sério,
gente. Qual parte de “HÁ PROVAS DE QUE A AGENTE FOI DEBOCHADA E DESRESPEITOSA
CONTRA O JUIZ, QUE NÃO AGIU COM DESRESPEITO EM NENHUM MOMENTO” esse povo não
entende? Pior: qual parte disso a IMPRENSA não entende? Bom, aqui faço uma mea culpa: eu é que não deveria esperar que a imprensa entendesse ou
quisesse entender alguma coisa, ao invés de simplesmente viver de escárnio e denuncismo,
como covardes abutres da honra de pessoas de bem que são.
E o
que há de mais importante ser frisado é que FOI A AGENTE DE TRÂNSITO QUEM INGRESSOU COM A AÇÃO INDENIZATÓRIA
CONTRA O JUIZ. ERA ELA QUEM QUERIA A INDENIZAÇÃO!!! Só que ela se
ferrou, pois a prova demonstrou que a errada era ela, e saiu ela condenada por reconvenção!
Tenho
para mim, dentro de meu constitucionalmente assegurado direito à liberdade de
expressão, que essa cidadã está buscando locupletar-se da pseudo-fama que a
imprensa vem lhe atribuindo. Talvez a vejamos em breve em reality shows ou revistas especializadas, mas não consigo deixar de
ter certeza de que claramente ela só
quer conquistar fama em razão desse episódio e se vingar pela condenação
sofrida. E pretende fazê-lo desviando o foco dos fatos como realmente
aconteceram: ela descumpriu seus deveres funcionais como servidora pública,
pois, ao invés de simplesmente multar o Juiz pelo deslize, que todos cometemos,
foi lá ser boca-dura e desrespeitosa, e ainda insinuou que ele haveria agido
como se “Deus” fosse.
O
problema não foi a agente ser boca-dura e debochada com o Juiz. Foi ela ter
sido boca-dura e PONTO, seja com quem fosse.
Numa
breve consulta ao site do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, é fácil
perceber que a Sra. Luciana é apaixonada
pelo Poder Judiciário! Confia plenamente nos Juízes, tanto que já levou a eles
dezenas de pedidos, quase sempre pedindo indenizações, tal qual a ação que
ingressou contra o Juiz Carioca.
Vejamos lá (a lista é grande):
0220154-09.2007.8.19.0001
(2007.001.214897-3)
Autor:
LUCIANA SILVA TAMBURINI
Réu:
CENTRAIS ELETRICAS BRASILEIRAS S A ELETROBRAS
Fase:
Arquivamento
Comarca:
Comarca da Capital
Serventia:
Cartório da 20ª Vara Cível
0042803-15.2008.8.19.0001
(2008.001.042400-8)
Autor:
LUCIANA SILVA TAMBURINI
Réu:
CENTRAIS ELETRICAS BRASILEIRAS S A ELETROBRAS
Fase:
Arquivamento
Comarca:
Comarca da Capital
Serventia:
Cartório da 20ª Vara Cível
0060464-36.2010.8.19.0001
Autor:
LUCIANA SILVA TAMBURINI
Réu: PORTO
RIO VIAGENS E TURISMO LTDA e outro(s)...
Fase:
Remessa
Comarca:
Comarca da Capital
Serventia:
Central de Arquivamento do 1º Núcleo Regional
0208211-19.2012.8.19.0001
Impugnante:
MSC CRUZEIROS DO BRASIL LTDA e outro(s)...
Impugnado:
LUCIANA SILVA TAMBURINI
Fase:
Remessa
Comarca:
Comarca da Capital
Serventia:
Central de Arquivamento do 1º Núcleo Regional
0176073-33.2011.8.19.0001
Autor:
LUCIANA SILVA TAMBURINI
Réu:
JOAO CARLOS DE SOUZA CORREA
Fase:
Remessa
Comarca:
Comarca da Capital
Serventia:
Cartório da 36ª Vara Cível
0130733-37.2009.8.19.0001
(2009.001.131285-0)
Autor:
LUCIANA SILVA TAMBURINI e outro(s)...
Réu:
STRIPCENTER PARTICIPACOES S A
Fase:
Juntada
Comarca:
Comarca da Capital
Serventia:
Cartório da 14ª Vara Cível
0312565-37.2008.8.19.0001
(2008.001.310522-4)
Autor:
LUCIANA SILVA TAMBURINI
Réu:
SUPERINTENDENCIA DE DESPORTOS DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO SUDERJ CP08
Fase:
Remessa
Comarca:
Comarca da Capital
Serventia:
Cartório da 3ª Vara da Fazenda Pública
0113097-53.2012.8.19.0001
Embargante:
SUPERINTENDENCIA DE DESPORTOS DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO SUDERJ CP08
Embargado:
LUCIANA SILVA TAMBURINI
Fase:
Ato Ordinatório Praticado
Comarca:
Comarca da Capital
Serventia:
Cartório da 3ª Vara da Fazenda Pública
0083486-84.2014.8.19.0001
Impetrante:
LUCIANA SILVA TAMBURINI
Impetrado:
CASSIA PINHEIRO MENDES
Fase:
Expedição de Documentos
Comarca:
Comarca da Capital
Serventia:
Cartório da 1ª Vara da Fazenda Pública
0076014-42.2008.8.19.0001
(2008.001.074919-0)
Autor:
LUCIANA SILVA TAMBURINI
Réu:
TIM CELULAR SA
Fase:
Arquivamento
Comarca:
Comarca da Capital
Serventia:
Cartório do 8º Juizado Especial Cível - Tijuca
0173822-13.2009.8.19.0001
(2009.001.174456-6)
Autor:
LUCIANA SILVA TAMBURINI e outro(s)...
Réu:
BUFFET CAROL FESTAS
Fase:
Arquivamento
Comarca:
Comarca da Capital
Serventia:
Cartório do 8º Juizado Especial Cível - Tijuca
0232573-90.2009.8.19.0001
(2009.001.233275-2)
Autor:
LUCIANA SILVA TAMBURINI e outro(s)...
Réu:
CONDOMINIO RESIDENCIAL BEAU LIEU
Fase:
Arquivamento
Comarca:
Comarca da Capital
Serventia:
Cartório do 8º Juizado Especial Cível - Tijuca
0013574-05.2011.8.19.0001
Autor:
LUCIANA SILVA TAMBURINI e outro(s)...
Réu:
TAM LINHAS AEREAS SA
Fase:
Arquivamento
Comarca:
Comarca da Capital
Serventia:
Cartório do 3º Juizado Especial Cível
Luciana
Tamburini processou a Eletrobrás duas vezes. Processou a Porto Rio Vigens e
Turismo e a MSC Cruzeiros do Brasil. Processou a SUDERJ, uma tal de Cássia, a
TIM, o Buffet Carol Festas, o Condomínio Residencial Beau Lie, a TAM...
Deus
do céu! Luciana processa todo mundo! Começo a desconfiar que é ela quem tem
algum problema com o mundo... De todo modo, obrigado, Luciana, por sua
confiança no Poder Judiciário, trazendo cada pequeno detalhe de sua vida a nós,
para que resolvamos seus problemas por você. Talvez ela me processe também, mas
tudo bem, apresentarei reconvenção como fez o colega magistrado, e sei que ela
terá dinheiro para me indenizar. Afinal, recebeu uma boa grana de um bando de
imbecis na “vaquinha” :)
O colega
magistrado, no meu humilde entender, só cometeu um erro: prendê-la por desacato. Acho que o crime cometido nesse
tipo de situação é outro: é CRIME DE
ABUSO DE AUTORIDADE.
Vejamos
o que diz o art. 4º da Lei nº 4.898/65:
Art. 4º Constitui também abuso de autoridade:
h) o ato lesivo da honra ou do patrimônio de pessoa natural ou
jurídica, quando praticado com abuso ou desvio de poder ou sem competência
legal;
Viram
só? Pouco importava o fato da vítima ser Juiz de Direito. Se um agente público
debocha da honra de um cidadão, lesando sua honra em evidente abuso de poder,
isso é CRIME DE ABUSO DE AUTORIDADE. Só isso!
Infelizmente
a “pena” para esses crimes é ridícula:
§ 3º A sanção penal será aplicada de acordo com as regras dos
artigos 42 a 56 do Código Penal e consistirá em:
a) multa de cem a cinco mil cruzeiros;
b) detenção por dez dias a seis meses;
c) perda do cargo e a inabilitação para o exercício de
qualquer outra função pública por prazo até três anos.
Enfim.
ao atacar a honra daquele cidadão, humilhando-o
por estar sem seus documentos (ao invés de, simplesmente, tascar-lhe as
desagradáveis multas correspondentes), a agente praticou crime e devia estar
respondendo por eles.
E
tem outro detalhe: de acordo com o art. 301 do Código de Processo Penal,
qualquer cidadão pode prender
em flagrante quem esteja cometendo um crime, porém, as autoridades (que
obviamente inclui o Juiz..) têm o DEVER
de efetuar a prisão em flagrante, sob pena de praticar o crime de prevaricação
caso não o faça!
Não
sei quem é o Juiz carioca. Não o conheço, nem sei nada a seu respeito. Talvez ele
seja um bom Juiz, talvez não. Talvez sofra de juizite, talvez não. Não sei. Mas sei que nesse caso, após
cuidadosa leitura do processo (disponível na internet), ele está sendo injustamente
malhado, e sinto-me, igualmente, ofendido por tudo que está sendo dito na
imprensa a respeito. Felizmente ele está tendo a inteligência (e o sangue de
barata) de não se manifestar a respeito, brilhantemente ciente de que qualquer
coisa que venha a dizer será distorcido.
Eu
mesmo fui parado pela Polícia Rodoviária Federal na estrada no último final de
semana. Distraído, fiz uma ultrapassagem onde não podia... Caramba, lugar com
ampla visibilidade, não tinha nenhum carro vindo em sentido contrário, nem
percebi que era faixa dupla contínua no chão (até porque estava tão apagado que
mal dava pra ver). Tenho tudo registrado na minha câmera do carro, que filma
tudo que acontece.
Enfim,
fui parado logo adiante. O policial que me abordou foi educado e cordial, como
deve ser. Pediu meus documentos (eu não me identifiquei como Juiz, já por conta
desses últimos acontecimentos). Entreguei CNH e documento do carro. Ele então
disse que eu havia feito uma ultrapassagem em local proibido e que seria
multado. Fiz aquela básica cara de revolta (comigo mesmo), e disse “é, fazer o
que...”, e esperei a lavratura do auto de infração.
Enquanto
isso o colega dele veio me dar “lição de moral”, no bom estilo “good cop – bad cop”. Eu comentei por
alto que achava um absurdo ser proibido ultrapassar naquele local, com
amplíssima visibilidade, sem nenhum carro vindo em sentido contrário, numa
descida.. enfim, tudo amplamente favorável pra ultrapassagem. Pois o cara
desandou a me escrachar, que era um absurdo eu ter ultrapassado ali, me chamou
de um monte de coisa que prefiro nem repetir e assim seguiu. Nesse momento
pensei seriamente em dar a “carteirada” e prendê-lo pelo abuso de autoridade.
Afinal, ele tem todo o direito (e dever) de me multar se eu pisei na bola, mas ser
grosso comigo e me dar lição de moral, não! Olhei bem pra cara dele, xinguei mentalmente
e dei-lhe as costas, deixando falando sozinho. Fui ao outro PRF, assinei a
maldita multa, entrei no carro e fui embora.
E
indo embora fiquei pensando “imagine seu tivesse dito que era Juiz...” Do jeito
que anda essa moda de esculhambar Juiz, era capaz de eu ter saído preso,
simplesmente por ser Juiz, pois isso virou crime hediondo segundo o STF
(Supremo Tribunal do Facebook).
Deixo
aqui ainda uma reflexão: não parece ser uma enorme coincidência um caso tão sem
importância nenhuma como esse estar sendo tão enaltecido pela imprensa pra
esculhambar um Juiz (e, com ele, todo o Judiciário), bem no momento em que
estão sendo descobertos inúmeros escândalos da Petrobrás e bem no momento em
que o Judiciário pleiteia a recomposição de seus vencimentos, que estão defasados
desde 2006? Coincidência, não?
Ahhh
mas o Juiz não é Deus! Concordo. É pouco provável que o “Deus” supremo, chamado
pelas mais diversas religiões por nomes distintos, tais como Jeová, Javé, Alá
etc., esteja neste planeta prestando concurso público e julgando processos.
Para
não me aprofundar demais na
teologia e aspectos filosóficos da questão, fui ao Dicionário Aurélio buscar
definição do que é “deus” (com letra minúscula, propositalmente). Eis a
resposta:
1 Ser supremo.
2 Cada um dos
membros da Trindade.
3 Divindade do
culto pagão ou de qualquer religião não derivada do mosaísmo.
4
Homem heroico ou de superioridade incontestável.
5 Objeto que exerce
grande influência ou grande poder.
O Juiz não é um ser supremo. Também
não é membro da Trindade (católica), embora seja presentante de um dos três poderes. Não é divindade. Mas vejam só
os conceitos de número quatro e cinco. Talvez tenhamos algo de “divino” em nós.
Tenho a mais plena certeza de que a enorme maioria dos Juízes do Brasil são
pessoas heroicas, pois comprovadamente os mais trabalhadores do mundo.
E não paremos aí: Têm também
superioridade incontestável, atestada por dificílimo concurso público de
provas títulos. Ademais, infelizmente,
Juízes viraram também objetos, ou
“unidades de produção” como já fomos chamados por uma certa Corregedoria, e não
há dúvidas de que exercem grande poder.
Se Deus (letra maiúscula) nos fez à sua imagem e semelhança, talvez o Juiz tenha algo de deus, sim (com letra minúscula). Não Aquele Supremo, mas alguém de superioridade comprovada, no mínimo, por concurso público de provas e títulos. E nem precisamos lembrar que Juízes decidem, diariamente, sobre a vida e a morte; sobre a liberdade ou a prisão; a justiça ou a injustiça. Até damos filhos às pessoas!!! Alguém aí discorda que isso não é um poder divino e maravilhoso? Já escrevi em outras colunas que me sinto frequentemente um instrumento dos desígnios de Deus (esse, sim, com letra maiúscula). Talvez sejamos, portanto, um pouquinho deuses sim... Não digo isso pra “me achar” e tenho pavor de “juizite”. Mas, gente, peralá... temos que parar com essa mania de sempre achar que o Juiz está errado em tudo que faz e é sempre culpado diante de qualquer acusação.
A agente de trânsito não
entendeu que estava diante de um agente político, de um dos Três Poderes, e que
debochar dele é debochar do próprio Estado Democrático de Direito. É debochar
de si própria, sendo ela titular de mais de uma dezena de ações indenizatórias
contra deuses e o mundo na Justiça Carioca. E pelo que consultei, já ganhou
bastante dinheiro com isso!!! Também não entende muito, pelo visto, sobre a Lei
dos Crimes de Abuso de Autoridade.
E a
imprensa... bem... já que fazer jornalismo sério não vende jornal, o que resta
é denuncismo e sensacionalismo, que é sua especialidade.
E
agora, a crítica aos Juízes, que serve especialmente pra mim.
Desde
que começou esse assunto da agente de trânsito as redes sociais “privadas”,
grupos de discussões e grupos de e-mails formados por juízes de todo o Brasil
têm estado bem agitadas. Todos profundamente revoltados com a imprensa e a
indevida publicidade distorcida que
tem sido dada aos fatos, bem como em razão do silêncio fúnebre das Associações
que nos representam.
Sou
um desses. Tenho destilado minha profunda indignação nesses espaços, ao lado de
colegas de todas as Justiças e Estados. Nenhum Juiz suporta essa enorme
injustiça! E, em consequência, são páginas e páginas de lamúrias, de
frustração, lamentações...
Acho que os deuses estão carentes.
Amigos
Juízes, depois de muito refletir, penso que não adianta nada a gente ficar se
lamentando pelo fato de “o povo” não gostar da gente. Primeiramente, graças ao
Deus Constituinte, porque não somos detentores de mandatos eletivos, mas
investidos em razão de nossa capacidade demonstrada por meritocracia em
Concurso Público. E nós acabamos lá se lamuriando, que trabalhamos feito
condenados, que não temos reajuste de subsídio desde 2006, que ficamos levando
pedrada injustamente, que ninguém nos ama bla bla bla...
Mas
é óbvio que o povo não gosta da gente! E por que haveriam de gostar? Acham que
as pessoas enxergam que por detrás da “Operação Lavajato” há um Juiz? Que por
trás de todo o trabalho contra a corrupção, há Juízes? Que a gente trabalha pra
caramba e que o povo só tem direitos porque estamos aqui para assegurá-los?
Fala
sério!
Se
você contrata um serviço de internet pra sua casa e a velocidade fica uma
porcaria, você, colega Magistrado, por acaso quer saber se os funcionários
daquela empresa trabalham duro e são extremamente bem treinados em suas
ciências, ou se seus equipamentos são de última geração, ou se estão investindo
fortemente em infraestrutura? Claro que não! A gente xinga e quer ver o
presidente da empresa pendurado num poste!
Sejamos
francos. O “serviço” que a gente presta é uma droga! É lento, é caro, é
burocrático, é cheio de riscos. Ninguém em sã consciência optaria por contratar
nosso trabalho se houvesse outra opção. Tanto que a cada dia mais grandes
empresas firmam cláusulas compromissórias, para que suas desavenças sejam
resolvidas por árbitros escolhidos por eles mesmos, e não por Juízes.
Se o
nosso serviço não presta, o povo tem mais é que olhar feio pra nós mesmo.
Pelo
menos, como bem me lembrou meu amigo e colega Morian, que teve a infeliz missão
de “herdar” a 1ª Vara Cível aqui de União da Vitória, a parte boa é que as
críticas geralmente vêm sob a forma de massa, de rebanho, em efeito manada. Só
se critica via Facebook e demais
meios interpostos. Aqui no mundo real, frente a frente com partes e seus
procuradores, é raríssimo sermos desrespeitados, e na grande maioria das vezes nossas
decisões são cumpridas e conseguimos exercer nosso papel de pacificação social
com muito orgulho e satisfação. O mundo do barbarismo e da verborragia asinina
fica quase sempre restrito ao Supremo Tribunal do Facebook, no qual quem não
for um bom boizinho e seguir a manada (falando mal do Juiz) será pisoteado.
Claro,
a “culpa” não é nossa. A gente faz a nossa parte. Não temos estrutura, a lei é
um lixo, a sociedade é hiperlitigante... é verdade. Mas o povo não tem nada a
ver com isso.
A
parte boa é que não estamos sozinhos. O Brasil é expert em prestar péssimos
serviços públicos. A polícia não presta. Ministério Público não presta. Saúde,
não presta. Leis são péssimas. A imprensa só atende a quem interessa. O correio
é uma lerdeza só. Serviços de telefone e comunicações em geral só casam stress.
Cartórios... nem vou comentar. Tudo no Brasil é uma droga. Por que haveria o
Judiciário de ser diferente? Só porque tem os profissionais mais bem
qualificados? Assim como o serviço lá da internet, ter os melhores equipamentos
não é suficiente...
Contudo,
só porque nosso serviço é ruim isso não significa que não estamos legitimados,
como todos os demais profissionais do país que prestam maus serviços, a lutar
por melhorias salariais, estruturais, sociais e tudo mais.
Só não esperem que o povo vá nos apoiar nessa luta. O povo só nos enxerga como “parte do Governo”, que ganha demais presta um serviço longe de ser satisfatório.
Em
parte dá pra entender o porquê de casos que envolvem Juízes terem tanta repercussão:
primeiro, porque a imprensa sempre enaltece exageradamente esses casos, seja a
mando do Governo, que sonha em ver um judiciário fraco e encabrestado, seja por
interesse próprio em subjugar o único dos Poderes da República que tem o condão
de limitá-la. Mas, sobretudo, creio que seja porque somos o último dos três poderes em que o povo
ainda deposita alguma esperança. Então,
é natural que fiquem revoltados ao verem que aqui também não estamos no
primeiro mundo.
Temos
que parar de ligar tanto pras reclamações do povo e tratar de fazer o nosso
trabalho, da melhor forma possível, como estamos – majoritariamente – fazendo. Tratar
de botar pra fora os maus profissionais que há entre nós, e restringir um pouco
essa proximidade tão exacerbada com o povo, lembrando que, afinal, somos
agentes de Poder, representantes do Poder Judiciário, e que essa excessiva
abertura não está nos fazendo bem. Estamos no mesmo patamar de Deputados,
Governadores... Será que a Sra. Luciana teria esculhambado o Governador do Estado?
Ou algum deputado?
Ser
um Poder “do Povo” é tarefa do
Legislativo. Para nós, essa abertura excessiva está nos enfraquecendo. Uma vez
que o Juiz se mostra como “homem comum”, aqueles que são atingidos por suas
decisões ficam com menos medo de descumpri-las. A pessoa por debaixo da toga é
humana; mas a figura composta pela toga exerce misteres de divindade. Basta ver
a figura principal da Justiça: a Deusa Thêmis.
Lembremo-nos
do filme “300”, em que para a derrota do “Deus Xerxes” bastou que ele fosse ferido,
e visto sangrando, como “humano
mortal” que era.
O
Juiz tem lá sua parcela divina sim. Protege as pessoas de bem, condena os maus,
resgata os bons, frequentemente decide entre a vida e a morte ao determinar a
concessão de tratamento médico a quem precisa, e até mesmo concede filhos a
quem os deseja. Raramente com a eficiência desejável, mas a gente faz bem mais
do que o possível com o sistema imprestável que temos em mãos.
Não
somos deuses de verdade, mas exercemos uma parcela desse poder na prática. E é
muito bom saber que estamos aqui para fazer o bem a quem for possível, dentro
desse universo processual burocrático ineficaz ao qual estamos eternamente
atrelados.
Não
queremos ser tratados como deuses, embora uma oraçãozinha de vez em quando, pedindo
por nós, certamente faria bem. Só queremos, como todo e qualquer cidadão,
sermos tratados com respeito. Se nosso trabalho é uma porcaria, desculpem, mas
a culpa não é nossa (Juízes), e sim NOSSA, como brasileiros.
A
absoluta maioria das ações judiciais em trâmite no país são em razão de pessoas
(sim, VOCÊ!) que não pagam seus impostos (execuções fiscais) ou estão
reclamando de questões previdenciárias (INSS) ou da prestação de serviços
públicos (bancários, saneamento, telecomunicações, energia elétrica). É só por isso que as ações no Brasil
demoram uma eternidade!
E a
culpa é de todos nós. Nós temos Agências Reguladoras que não prestam pra nada,
além de serem cabides de empregos; temos um INSS que só causa problemas; um
Ministério Público que não prioriza ações coletivas; um Legislativo que não faz
leis decentes nem voltadas ao atendimento do Interesse Público, e um Executivo
que, além e todos esses defeitos, é expert em descumprir decisões judiciais;
Tá
tudo errado, e aqui no nosso quintal a coisa não é diferente. Então não adianta
ficar se lamentando porque não somos amados, que somos criticados e tudo mais.
Larguem(os) mão de serem(os) carentes. Façamos o que estiver ao nosso alcance e
lutemos por benefícios, como qualquer trabalhador. E tratemos de não no
diminuir, nem a importância do nosso cargo, que é muito maior do que qualquer
um de nós. Deixemos a crítica de lado e sigamos fazendo o que nos for possível,
por quem for possível. Mesmo a Sra. Luciana, ávida litigante do Judiciário
Carioca, por mais que nos deteste, terá seus processos julgados, por Juízes, e
não pelo STF (Supremo Tribunal do Facebook).
Abraços
a todos!