Uma empresa não pode impedir que seus funcionários, independentemente de ocuparem cargos equivalentes ou superiores, mantenham relacionamento afetivo entre si. O entendimento foi ratificado pelo TST (Tribunal Superior do Trabalho) em recente decisão que manteve a condenação da rede de lojas Renner a indenizar em R$ 39 mil um ex-funcionário por danos morais.
O ex-funcionário trabalhou na empresa por 25 anos e foi dispensado, por justa causa, em razão de manter relacionamento amoroso no ambiente de trabalho.
Após ser demitido sem receber as verbas rescisórias, o trabalhador ajuizou ação na Unidade Judiciária Avançada de Palhoça (interior de Santa Catarina), pedindo a conversão da demissão para rescisão sem justa causa, além da indenização e outras verbas trabalhistas.
A empregadora, por sua vez, alegou em sua defesa que o funcionário foi dispensado por ter praticado falta grave ao descumprir orientação que não permitia o envolvimento, que não o de amizade, entre superiores hierárquicos e subalternos, mesmo fora das dependências profissionais.
Após a análise dos fatos, a juíza de primeira instãncia considerou inconstitucional o código de ética da empresa e, por isso, declarou nula a dispensa motivada. Levou em conta o fato de o empregado ter prestado serviços à empresa, por mais de duas décadas sem jamais ter sofrido uma única advertência ou suspensão.
Ao considerar o valor da reparação, fixado em quase R$ 39 mil, a julgadora considerou fatores tais como a intensidade do sofrimento do ex-empregado, a importância do fato, a inexistência de retratação espontânea da dispensa pela Renner, o longo tempo dedicado à empresa e, ainda, o fato de o trabalhador ter concordado, em juízo, com a proposta de reintegração, que não foi aceita pela empresa.
Em segunda instância, o TRT-12 (Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região, em Santa Catarina) analisou o recurso da Renner. A corte entendeu que a despedida por justa causa foi uma medida extrema, prevista na CLT somente para as hipóteses em que a gravidade do ato faltoso tornar impossível a manutenção do contrato de trabalho, devido à quebra de confiança entre as partes envolvidas. Sem discutir a adequação ou não do relacionamento entre os envolvidos, o TRT entendeu que não houve mau procedimento (artigo 482, alínea "b" da CLT) por parte do trabalhador demitido, pois ele e a parceira se conheceram no ambiente de trabalho, mas namoraram fora dele.
Para o TRT, são "vicissitudes da vida" que ocorrem, inclusive, "com chefes de Estado e renomados políticos", já que "é da natureza humana estabelecer relações empatias e antipatias, encontros e desencontros, amores e desamores". Ainda de acordo com a decisão do colegiado, a violação do código de conduta poderia até ensejar punição, mas não a justa causa. Outro aspecto considerado foi o fato de a despedida ter sido considerada discriminatória, pois a outra pessoa envolvida foi dispensada sem justa causa.
Desse modo, a conclusão do TRT-SC foi a de que a proibição do relacionamento afetuoso entre seus empregados fora do ambiente do trabalho caracterizou lesão moral, com ofensa do direito da personalidade humana, especialmente a intimidade e a vida privada.
TST
Insatisfeita, a Renner foi ao TST e apresentou agravo de instrumento, que foi analisado pela 2ª Turma da corte. Para a Renner, a demissão viola o artigo 5º, inciso V, da Constituição Federal, que trata do direito à indenização por dano moral, além de a decisão divergir da jurisprudência.
A 2ª Turma, por sua vez, considerou a condenação da empresa acertada.
O relator, ministro Renato Lacerda Paiva, destacou que, ao analisar os fatos, o TRT-12 deu o exato enquadramento do caso concreto à norma legal (artigos 186 e 927 do Código Civil), segundo os quais aquele que, "por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito" e, ainda, que o responsável pelo ato ilícito causador de dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.
Além disso, ressaltou Lacerda Paiva, qualquer modificação da decisão exigiria nova avaliação dos fatos e provas do processo, conduta vedada pela Súmula 126 do TST.
A decisão de negar provimento ao agravo foi unânime.
Fonte: Última Instância
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